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quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Cinescritas

 

PASSANDO À DE ZÉ MARÔVAS / 2009 um filme de AURORA RIBEIRO

 Realização: Aurora Ribeiro 

Argumento : Aurora Ribeiro, Ulisses do Monte, Zé Marôvas

Fotografia: David Sim Sim 

Som: Diane Meireles

 Montagem: Tomás Melo, Aurora Ribeiro 

Música: Ivan Moody 

Com: José Marôvas e amigos e fregueses da loja de Redondo. 

Produção: Pana Tainies/ΠΑΝΑταινιεs(Portugal/Grécia,  2009)

Primeira exibição pública: Outubro de 2009, no Doclisboa ’09 (Grande auditório da CulturGest e Cinemas Londres)

Cópia: Cinemateca Portuguesa-Museu do Cinema, betacam digital, cor, leg


Prémios : Melhor curta /DocLisboa




A ruralidade portuguesa, o interior do país, vindos do século XX, no XXI, aproxima tematicamente os filmes de Tânia Dinis, Aurora Ribeiro e Maya Rosa que a sessão reúne: NÃO SÃO FAVAS, SÃO FEIJOCAS propõe o retrato de uma velha camponesa do Norte comentado por ela própria; PASSANDO À DE ZÉ MARÔVAS fixa a figura de um velho comerciante do Redondo, dono de uma loja a que já faltam fregueses; também alentejano, NO JARDIM DO MUNDO é coral e trabalha a memória política da História portuguesa na perspectiva das suas marcas na região.


PASSANDO À DE ZÉ MARÔVAS foi filmado no Redondo em 2007 – o genérico final esclarece –, e também ele retrata a vida de um velhote, desta feita o dono de uma loja à beira da estrada que noutros tempos teve mais freguesia. Aqui, capta-se o momento presente naquilo que este comporta da mudança dos tempos, do tempo que passa, para tomar do título uma das palavras-eixo do filme de Aurora Ribeiro. Já a duração do relativamente sossegado plano-sequência de abertura o indica: mantendo-se atenta à fachada da loja e ao lojista em gestos de chegada para novo dia de abertura a quem aconteça passar, a câmara fixa-os do outro lado da estrada, deixando que a imagem seja atravessada pelos carros que a cruzam, anunciando-se antes pelo som off, e dando-lhe algum tempo. Entretanto, o senhor, José Marôvas, não é difícil adivinhar que dele se trata e não tardará a que se tenha a certeza, vai montando o cenário diário do palco da sua pequena loja, numa casa sem paredes mas com montra armada na fachada, patinada e repleta de ganchos, e na rua por onde os artigos, diversos, vão sendo dispostos. A fachada daquela loja lembra uma intervenção de arte urbana e a própria loja, por cujo interior se faz a entrada na outra manhã de início de dia do filme, é um autêntico bazar onde se diria ser possível encontrar os mais e os menos prováveis dos artigos. Onde é que ainda se compra uma casinha para grilos? 



A loja é o cenário do lojista, mas, mostrando aspectos da vila e do campo circundante, PASSANDO À DE ZÉ MARÔVAS tem outro. O da taberna, espaço de encontro daquela comunidade, onde os homens mais velhos ensaiam brincar com um pião como se fossem garotos, e, claro, se discute o Benfica e se lê o jornal. É o apontamento que fixa a comunidade, envelhecida, da vila alentejana a que José Marôvas pertence, no seu pacato modo de vida. Que o de José Marôvas conheceu dias mais agitados, por ele vividos como tendo sentido, é uma evidência. Ele discorre sobre a sua realidade em três momentos, fazendo saber da diferença sentida depois da construção da auto-estrada que liga Elvas a Badajoz, depois das vias rápidas desviarem a circulação do meio das vilas alentejanas e as deixarem mais isoladas. Contando histórias da sua vida de lojista, que é uma forma de ocupar os dias, “a gente tem de passar o tempo de qualquer maneira”. Na conversa filmada com o amigo, que interpela a realizadora fora de campo – “Também a gente tem a noite e vive nela, não é menina?” – fica a saberse que Marôvas não é apreciador de vinho tinto, que não é cristalino como o branco, mas “escuro”, como a noite, dirá o amigo. Retrato do interior alentejano, PASSANDO À DE ZÉ MARÔVAS capta a sensação de abandono deixada pelo tempo, e dá voz ao coro masculino dos cantares alentejanos, que no alinhamento da sessão é também um raccord oportuno com NO JARDIM DO MUNDO.


Maria João Madeira in Folha da Cinemateca 7/6/2017


CINEMATECA PORTUGUESA-MUSEU DO CINEMA 


CINEMA PORTUGUÊS: NOVOS OLHARES – IV 


7 de Junho de 2017