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sábado, 8 de abril de 2017

cinema de segunda

Segunda,  10/4;  21h30

Sala escura da Harmonia

Ciclo WWenders




Cinema de Segunda/\Buena Vista Social Club–Ciclo Wim Wenders
Buena Vista Social Club – A Câmara aprendeu a Dançar  de Paula Soares



 To witness that, to be present, as this unbelievable story took place, to be allowed to accompany these musicians from oblivion, literally, to a standing ovation on the stage of Carnegie Hall, that was a gift and a privilege without equal, and at the same time a unique lesson in dignity and humility, for us and for future generations. Wim Wenders, The Companion Book to the Film Buena Vista Social Club A experiência em Buena Vista Social Club (1998), situa-se como uma nova etapa na fase que designámos por ‘o explorar do sentir – fase Yin’ na biografia fílmica de Wim Wenders. Se Wenders sempre procurou imagens ‘puras’, sons inovadores, e almas que sentem, em Buena Vista Social Club encontrou tudo isso, como que por acaso... Ao tentarmos definir o ‘estilo’ fílmico que Buena Vista Social Club nos oferece, deparamo-nos com uma ausência de uma definição existente que possa ser adequada. Pois, embora a superfície pareça estar envolvida num formato de documentário, o dançar da câmara conta-nos histórias biográficas que fluem de conteúdo em conteúdo ao som da música cubana. O perceptor entra nessa dança da câmara e mergulha na história e na música das personagens que a compõem. Eis que surge um documentário com alma que já não pode ser considerado como um ‘mero’ documentário, mas como uma narrativa que flui como a música que a compõe. Wenders descreve a sua postura perante a rodagem de Buena Vista Social Club do seguinte modo: Already during the filming it dawned on me that we weren’t so much making a documentary, as a character piece. We had discovered a story and we were following it. Compay, Ibrahim, Rúben, Omara, Eliades, Pío and the others were the leading actors in this story, more the ‘principal characters’, if I may put it like that, than ‘just themselves’. Only this story was true. (And so, of course, it wasn’t a really story at all). (Wenders 2000/1999:15) O próprio Wenders descreve, neste excerto, a sua experiência que transcendeu o documentário pela ligação anímica das personagens que passaram frente à câmara. A dinâmica que se criou entre as personagens que se auto-representavam e a equipa que os captava contribuiu para uma colagem perfeita que superou as ausências de fluxo narrativo que habitualmente caracterizam um documentário. A dança da câmara fundiu-se com o cenário que captava. O clímax desse carácter de a câmara se fundir e se serpentear encontra-se no longo plano que descreve a subida das escadas entrando posteriormente numa grande sala ao som de Rúben González ao piano tocando para um grupo de jovens bailarinas. A beleza estética desse enquadramento em termos visuais e sonoros transporta do limiar do documentário para o plano da poesia. Mais uma vez, como noutros momentos que integram a biografia fílmica de Wim Wenders, a decisão de rodar um filme sobre a música e os seus autores idosos esquecidos durante décadas em Cuba, surgiu como algo de imprevisto e provocou um efeito inimaginável na popularidade dos sons e das imagens captadas. Ry Cooder, compositor bem conhecido de Wenders, deu-lhe uma cassete de música cubana gravada, pelo próprio, aquando de uma viagem a Cuba. Após ouvir esses sons, Wenders sentiu uma grande vontade de conhecer os seus autores. Com uma semana de antecedência Ry Cooder perguntou a Wim Wenders se queria ir com ele a Cuba. No espaço de uma semana, Wenders chamou uma pequena equipa de rodagem vinda da Alemanha para o acompanhar e rodou, sem guião, as histórias que lhe foram dadas a conhecer, em digital. O resultado desse trabalho iniciado e rodado ‘de improviso’, foi um sucesso planetário que conquistou as salas de cinema e as estantes de compact discs um pouco por todo o planeta. Roger Bromley descreve o trabalho efectuado por Ry Cooder e Wim Wenders como um produto de ‘arqueologia cultural’: Cooder and Wenders have excavated the remains of a lost, but living tradition and produced a work of cultural archaeology. (Bromley 2001:107) A nomenclatura ‘arqueologia cultural’ parece, particularmente, adequada, pois de facto, Buena Vista Social Club, surge como a descoberta de uma ilha perdida onde ainda prevalecem sons e atitudes que noutros lugares se extinguiram. Talvez tenha sido também por isso que a câmara tenha aprendido a dançar... A vivência individual de um grupo de músicos idosos foi colocada num plano que permitiu alargar essa vivência ao domínio do colectivo. O efeito do ‘puro sentir’ que a alma da música cubana transmite captado por uma câmara que aprendeu a dançar introduz um elemento novo na biografia fílmica de Wenders, o fluir das imagens como água que serpenteia num rio e embala o perceptor que nele ousa mergulhar.

Fonte : Projecto Piloto Matinés Cinéfilas - Vivências de Cinema e Multiculturalidade no Alentejo - Diário de Bordo, Editora Pedago, 2012


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