Samuel Fuller
Samuel Michael Fuller (August 12, 1912 – October 30, 1997)[1] was an American screenwriter, novelist, and film director known for low-budget, understated genre movies with controversial themes. Fuller's wrote his first screenplay for Hats Off in 1936, and made his directorial debut with the Western I Shot Jesse James (1949). He would continue to direct several other Westerns and war thrillers throughout the 1950s.
Fuller shifted from Westerns and war thrillers in the 1960s with his low-budget thriller Shock Corridor in 1963, followed by the neo-noir The Naked Kiss (1964). He was inactive in filmmaking for most of the 1970s, before writing and directing the war epic The Big Red One (1980), and the experimental White Dog (1982), whose screenplay he co-wrote with Curtis Hanson.
Fonte : https://en.wikipedia.org/wiki/Samuel_Fuller
3 de Março, sexta-feira no asm - auditório soror mariana
21h30 – Shock Corridor (1963), de Samuel Fuller
Organização: Cinema-fora-dos Leões / UÉ, DFIL
Apoios: SOIR, CHAIA,
Também de 63 é este filme, como o de ontem, Il Gattopardo. Os anos 60 cinematográficos especializaram-se em malaise, em mal-estar difuso e espesso - e é curioso, porque coincidem com a vertente ascendente dos 'gloriosos trinta' [anos de afluência, bem-estar, expansão] do nosso descontentamento. A historicidade de O leopardo, de meticulosa reconstituição cénica, não nos transporta 'para lá', para a Sicília dourada do príncipe melancólico, observador do Tempo puro: estamos a lê-la inteirinha no nosso presente, como um rebatimento dessa viragem garibaldina dos tempos, no Ottocento, sobre qualquer presente actual em geral - ou, em particular, sobre o nosso: sujeitos ao Tempo, somos sempre seres de transição entre-dois, e a História é menos o encaixe de uma narrativa bem arrumada do que a modalidade de uma constante impertença à existência - aquilo que os outros cineastas de Sicília!, Jean-Marie Straub e Danièle Huillet, filmaram também sob a designação inquieta de Trop tôt, trop tard. Mas é por essas datas que o pesadelo existencial mais se debruça da 'ascensão' para a sua vertigem, tal como o Hitchcock da semana passada (1958) também já testemunhara; e até desse ponto de vista (passe o jogo de palavras) a sua célebre invenção técnico-metafísica - recuo da câmara em simultâneo com zoom in - se torna marca d' época, ao mesmo tempo que signo condensador do seu gesto-padrão dominante: o beco vertical de uma tontura agoniada pendurada sobre o mundo da vida.
A tontura de Fuller, foi ele tê-la para dentro de um manicómio, beco longitudinal em forma de 'corredor' - quer dizer, em forma de uma galeria de personagens que declinam as formas-tipo profundas de uma patologia geral americana.
Sem amolecer um segundo nalguma verosimilhança aproximada, o filme troca-a pela implacável exactidão da parábola. O seu grande achado está na maneira como leva a trocar as leituras da epígrafe de Tucídides - “Prius dementat Jupiter quis perdere vult” - por um processo de interpretação, não directo, mas inverso.
Se a primeira leitura faz da frase o exergo para o destino individual do infiltrado (o jornalista que se faz passar por louco para obter a sua cache, a história de um assassinato cheio de 'implicações'), significando então que Júpiter selecciona aquele que tenciona perder, dementando-o, é este mesmo destino que conduz à leitura da frase como um enunciado geral sobre a América - histórico-nacional: ‘aquele[s]’ [que Júpiter quer perder] é, agora, a nação por inteiro: o espírito americano, sintetizado e condensado no pequeno grupo de conspiradores que subordinam tudo a um único fim, que os aprisiona a todos numa camisa de forças, numa monomania finalmente reduzida à sua ossada descarnada minimal: ‘who killed Sloan?’.
Porque a insistência maníaca ‘who killed Sloan?’ revela, quando se torna demente, que já o era: que já representava uma forma mental geral nacional, um tipo de acção expeditiva caracteristicamente americana - a perseverança pragmatista. Agora que se viu que o jornalista, que representa a América, se junta a toda uma galeria das formas de demência americana, o dito de Tucídides vale para a nação como tal, que está perdida na pessoa do jornalista (é quando o seu destino de louco singular transporta o da loucura colectiva): aquelas nações, aqueles povos, que Júpiter quer perder, primeiro dementa-as: todos os casos em redor do jornalista formam o caleidoscópio do respectivo testemunho. E é isso a parábola: quando o mais singular dos destinos compele a uma interpretação universal, inclusive uma frase que começara por remeter ela própria para um caso singular, e mesmo seleccionado.
As 3 testemunhas ‘do assassínio de Sloan’ são 3 testemunhos ‘por amostragem representativa’ da América, 3 histórias de vida que compendiam a das taras da nação, e cujas proporcionalidades da respectiva loucura são em si mesmas a sua própria decifração psicanalítica-social: o confederado (comunista) hiper-patriótico, o físico nuclear regredido à infância, o negro do ‘Kyklos’, enunciador literal da demência incompossível do discurso racista como tal (como veremos quando virmos o filme, não se trata apenas da contradição entre enunciado e enunciador, quando o negro apropria e emite o discurso racista contra os negros - mas, através desta, a contradição do próprio enunciado em si mesmo consigo próprio; como?: através do seu patente excesso em relação às suas próprias condições de enunciação, através da impossibilidade flagrante da sua universalização humana). É neste triplo anel que a monomania pessoal do jornalista se revela monomania patológica do sistema.
Antes do Ninho de Cucos, antes, muito antes, do grande Cuco eleitoral da pós-verdade (quer dizer: estruturalmente, ao mesmo tempo), vinde ver, vinde ver, como se pode acertar nas sondagens de 2020 vendo cinema de 1960. Anacrónicos, são os cordeiros sacrificiais (em baba e pasmo) das 'actualidades'.
jMM
Sem comentários:
Enviar um comentário