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terça-feira, 2 de agosto de 2016

cfl

Sexta, 5/7

asm -  auditório soror mariana





Clearcut  de Ryszard Bugajski*


Sessão integrada nos projectos CINED, Moving Cinema e No País do Cinema, em colaboração com a Associação Os Filhos de Lumière 

(com apoio do Instituto do Cinema e do Audiovisual e da Direcção Regional de Cultura do Alentejo).



Marlon Brando fotografado com um activista nativo americano e líder do American Indian Movement em 1982.

CLEARCUT / 1991, Ryszard Bugajski

Resumo da sessão:
Sem surpresas arriscamos dizer que, até ao momento, este foi o ponto mais brilhante do passeio cinematográfico pelo continente americano do ciclo Um Olhar a Oriente / A Oriente do Olhar. A importância desta visão motivou-nos a exibir o filme mesmo sem legendagem. Pedimos novamente desculpa pelo incómodo causado.
Clearcut (1991) parte de um cenário de destruição florestal do solo de uma antiga reserva índia para nos colocar na dentro de um problema judicial contemporâneo. Peter Maguire (Ron Lea), o representante legal dos índios, assiste à destruição da floresta e dá-se conta da sua incapacidade/inutilidade para reverter a situação dentro dos parâmetros legais vigentes, que servem injustamente os interesses da empresa madeireira, geradora de emprego, economia, etc. É aqui que começa o filme, como um arco esticado/tensionado ao máximo com a flecha pronta a disparar.
O vento anuncia a entrada em cena de Arthur (Graham Greene), um misterioso índio de jeans all star's, que rapta Peter Maguire (o advogado) e Bud Rickets (Michael Hogan), o dono da empresa madeireira. Na viagem que se segue entram todos os temas latentes nos filmes que vimos/exibimos anteriormente, mas invertidos. Tudo ao contrário. Entre muitas coisas o filme é isso, a ridícula situação de contar a História ao contrário. E se tivessem sido os índios a roubar violentamente a terra aos 'brancos'? 
Arthur ridiculariza Bud através de mímica, humilhando os brancos através de uma falsa imitação inimitável porque a História não foi feita ao contrário daquilo que é. Mas e se tivesse sido?
A potência do filme reside (mais uma vez) no facto de juntar imensos fios narrativos e nunca os conformar num final claro e único. Convida-nos a mergulhar num pesadelo de imensa estranheza. No decurso da discussão final, foi-nos possível delinear duas teses/hipóteses interpretativas (dentro de tantas outras).
Um, o filme é aquilo que é, o que nos dá a ver: um rapto destinado a falhar seguido de suicídio ( a água leva o que o vento trouxe).
Dois, o filme é o que sugere/invoca e nos convida a interpretar: Arthur (justiceiro) corporiza a raiva e o desejo de vingança de Peter que, para representar e honrar os índios, decide fazer justiça fora do plano legal, no modo dos índios guerreiros. Após falhar no plano legal, parte para o plano moral ou cede à tentação de executar o seu desejo mais íntimo: esfolar Bud, o proprietário da empresa madeireira. Nesta linha o filme é um percurso iniciático até ao estado mais selvagem e brutal de um homem profundamente frustrado. Os diálogos, pistas, símbolos objectuais, olhares e sugestões visuais que o filme nos dá leva-nos a inclinar-nos para esta leitura, no entanto, está longe de ser a única possível.
Não querendo destruir o que mais admiramos neste filme (a indefinição e o mistério), terminamos com uma questão central. O filme é varrido por imagens de índios conformados ao seu destino, ao tabaco e à bebida, ou seja, à sua extinção. Será que o verdadeiro espírito índio pode ainda surgir/existir desde que emergindo de um corpo 'branco'? Será que a natureza índia ancorada na memória da Terra é capaz de assaltar um corpo 'branco' revoltado? A resposta é: um grito de raiva, possessão e a História do avesso.


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