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segunda-feira, 7 de abril de 2014

cinema - fora - dos - leões e cinema fora de Évora



cinema - fora - dos - leões

Sexta,  11/4;  21h30


Sala Soror Mariana


https://www.youtube.com/watch?v=ZmhIMbdecEU


".....O admirável de The Tenant  - cuja última cena Roger Ebert declara decair ao nível das piores séries televisivas de mistério -  é a reclassificação que precisamente essa mesma última cena, não obstante, imprime a todas as anteriores: se o filme veicula concomitantemente a sua própria chave de leitura à medida que se desenrola (a saber, ele obriga à sua leitura como um exercício de discernimento entre a realidade e a alucinação paranóica do protagonista, o tão ilegível em filme como na vida real Roman Polanski), o acto cinematográfico final impugna radicalmente essa chave de leitura em retrospecção, e deixa o filme suspenso de um novo logos: se o que se passou se revela indecidível, é porque o próprio plano de mostração  - o próprio filme -  abdicou de qualquer possibilidade de verdade, impondo, como única realidade, a inconsistência ontológica daquilo a que chamamos 'a realidade', ou 'na realidade'. Não há 'a realidade', e, se ela é um grito, esse grito não é mais o grito dramático do horror, mas o grito pós-kafkiano da impossibilidade ontológica absoluta como novo domínio da existência, da qual nos tonámos os inquilinos.
A impossibilidade de real, decorrente do artigo infra-reproduzido, ilustra esse filme na perfeição. Cada um pode ad libitum assumir o ponto de vista, ora 'objectivo', ora 'subjectivo', do protagonista louco ou dos condóminos loucos, ora do paranóico ora da conspiração: são actos de fé indiscutíveis, que se anulam entre si. A rota implacável dessa anulação, para qualquer situação de inquilinato, é, porém, a que Polanski em 76 nos oferece nessa peça magistral de uma repetição diferenciadora: o grande logro não é que 'um de nós seja mentira'  - mas que ainda houvesse a verdade. É essa a 'forma de farsa' que a tragédia toma quando se repete: não é que ela não seja outra vez uma tragédia, mas é precisamente sê-lo, que é a farsa, e é sê-lo exacta e impossivelmente igual que gera a mais abissal diferença. Tal como Pierre Ménard não pode repetir o Quijote, Trelkovski não pode repetir Simone, para perceber que é por Simone não ser Simone, mas Trelkovski, que ela gritara, na primeira cena: mas Ménard repete o Quijote, abrindo uma diferença absoluta entre a realidade e ela própria, e Trelkovski faz o mesmo, ao repetir duas vezes o suicídio de Simone. Essa diferença, é que o Quixote de Ménard e de Cervantes é e não é o mesmo, o Trelkovski que volta a ser Simone para esta ter sido Trelkovski é e não é ele mesmo. 
Uma nova hipótese sobre a realidade  - ela consistir em impossibilidade, não poder jamais haver ponto de vista verdadeiro sobre ela -  foi-nos oferecido, uma primeira vez, pela indecisão sem princípio nem fim, por essa indefinida situação medial ultimamente impossível de determinar que é a do agrimensor K, inquilino d'o Castelo; uma segunda vez, pela repetibilidade diferencial, 'entre dois tiros', de Borges e de Robbe-Grillet; de novo, pelo parisiense polaco neste filme em inglês. E, finalmente, já não precisamos de sair de onde estamos para deixarmos de poder decidir o filme (embora, como qualquer inquilino ou como qualquer espectador, estejamos convencidos até mesmo ao fim de que era disso que se tratava). O último som do grito dele é o da nossa gargalhada, que agora são o mesmo som....."

dixit  JMM








cinema - a - este - de - Évora


ccr - Centro Cultural de Redondo


Sexta,  11/4;  21h30

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